Lembranças de um missionário

Neste mês que celebramos a Festa do Sagrado Coração de Jesus, me veio à memória a introdução do livro de Tomas de Saint Laurent intitulado “O livro da Confiança”: “Voz de Cristo, voz misteriosa da graça, que ressoais no fundo de nosso coração, palavras de doçura e de paz. A nossas misérias presentes repetis o conselho que o Mestre dava frequentemente durante sua vida mortal: ‘Confiança, confiança!'”

Missionários Arautos_Maputo

Sim. Essa voz misteriosa nos fala constantemente, mas pelas próprias circunstâncias de nossa agitada vida nos esquecemos de escutá-la, deixando nossos espíritos e nossos corações, amargos e agitados, no sentido contrário a essa voz misteriosa.

Recordando esta frase do Livro da Confiança, meu espírito remontou-se a mais de uma década atrás, trazendo á minha memória uma Missão em uma paróquia de um populoso bairro de Bogotá, onde a Imagem da Virgem de Fátima fazia sua peregrinação.

As pessoas se aglomeravam, se amontoavam depois da Missa, querendo de alguma maneira, tocar num pedacinho do céu na figura da Mãe de Deus, representada por esta imagem peregrina. Todos tinham algo a pedir, algo a agradecer.

Eu, desde um canto da igreja, observava essa voz da graça trabalhando, e me perguntava como essa graça atuava. O futuro me daria a resposta.

Em certo momento chegou a mim uma senhora banhada em lágrimas, pedindo a este missionário um conselho para apaziguar seu espírito e encher com uma luz de esperança seu coração atribulado. Ela me contava que seu filho de 15 anos havia caído no vício das drogas, e que seu coração de mãe não podia suportar ver o desastre que este vício horroroso havia feito nele.

Que conselho poderia dar-lhe? O que dizer em um momento assim?

Confesso que meu coração sentiu um aperto horrível, pois não sabia o que dizer. As únicas palavras que vieram em meus lábios foram: “Confiança, confiança! Coloque tudo nas mãos de Jesus, Ele não suporta um coração atribulado e dolorido, que implora sua ajuda, sobretudo o de uma mãe. Sempre está a seu lado para ajudá-la.”

A senhora pareceu tranquilizar-se com minhas pobres palavras, e saiu da Igreja.

Mas, se ela se tranquilizou, eu fiquei profundamente preocupado, pois confesso que, talvez por uma visão naturalista, não podia entender como ela havia saído calma com palavras tão pobres de minha parte.

Passou um ano, e a cena ainda permanecia em meu espírito.

Transcorrido este período tínhamos outra missão com a Imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima, em um bairro popular de Bogotá.

As cenas de fervor e entusiasmo das pessoas se repetiam como normalmente sucede nestas missões.

Mas qual não foi a minha surpresa, quando em meio as pessoas encontro aquela senhora que no ano anterior me havia procurado, só que desta vez, ela estava com uma fisionomia inteiramente alegre e tranquila. Me cumprimentou com entusiasmo perguntando-me se me recordava dela. Como não iria me recordar, se seu caso me havia marcado desta forma?

Me chamou a atenção a alegria e a paz de seu semblante, e lhe disse que sua fisionomia me fazia crer que o problema de seu filho havia sido solucionado.

Ela, com toda calma me disse que não, que seu filho continuava lutando com o problema sem muito êxito. Então, lhe disse surpreendido, “de onde saiu essa fisionomia calma, tão distinta da que havia visto um ano antes?”

E ali foi a lição de confiança que recebi.

Esta fisionomia, dizia ela, era pelo conselho que recebeu um ano antes, pois encontrou a paz no próprio coração de Jesus.

No coração de Jesus? – perguntei intrigado. Sim, disse ela, Ele me concedeu uma tal consolação que o problema se desfez no meu interior.

Ela começou a relatar-me como foi esse encontro com um Coração tão especial, que tanto amou os homens e por eles foi tão pouco correspondido.

Me contou que depois que saiu da igreja aquela vez, foi pedindo a Jesus com insistência, que lhe ajudasse no drama que estava passando, e assim passou o dia inteiro. A noite, antes de dormir, rezou e pediu mais uma vez e aos poucos foi chegando a paz a sua alma e ela adormeceu.

Durante um sonho, viu diante de si uma grande escadaria que subia até o infinito, e ela escutava uma voz que dizia: “Suba, suba!”. Ela começou a subir, mas o cansaço veio logo e a subida ia se tornando cada vez mais dificil. A voz continuava a animá-la “Suba, suba!”

Ela intrigada, olhou para o alto da escadaria tentando descobrir quem poderia ser aquele que a chamava com tanta insistência e deparou-se com a própria figura de Jesus, como a do Sagrado Coração, que com voz forte e semblante aprazível, a convidava a continuar subindo até Ele.

Ela tentou mais uma vez, mas suas forças lhe faltavam e gritou com voz forte, “Senhor, não tenho forças, ajuda-me!”, e nesse momento viu como que o braço de Jesus se esticando desde onde estava e lhe atraindo com força até ele, dizendo: “Filha minha, porque duvidas tanto, eu estou sempre ao seu lado para ajudar-lhe!”, e nesse momento o sonho se desfez.

A partir de então, a senhora sentiu-se inteiramente protegida e consolada, pois percebeu que Jesus a levava em Seu próprio coração.

O que mais me impressionou de todo o relato, foi a fisionomia de completa calma da senhora. Ela contava o fato como quem relata uma história comum, com uma naturalidade única.

Eu a felicitei por esse presente sobrenatural que havia recebido e lhe dei palavras de ânimo incentivando-a a nunca duvidar desse contato sobrenatural que tanto bem lhe havia feito.

Enquanto a senhora se distanciava, em meu interior se desenhava essa enorme lição de confiança de uma alma que soube entregar suas penas com fé no Coração de Jesus e saiu atendida em sua confiança. A verdade é que sem visão sobrenatural é difícil crer em um fato assim, mas também é verdade, que no mundo como o nosso só com espírito de fé conseguimos enfrentar o dia a dia. A segurança está em que Deus não abandona a seu povo, e, em um mundo como o atual concebido para viver sem Deus, aqueles que o buscam nunca serão defraudados.

Roberto Torres

Monsenhor João Clá é muito devoto ao Sagrado Coração de Jesus podemos conferir no lindo artigo: lada Lhe resistirá

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